Artigo: Por que é importante falarmos de velhice?
 

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Artigo: Por que é importante falarmos de velhice?

25 / Outubro / 2022

Profa. Dra. Marta F. Bastos

Em 14 de dezembro de 1990, a Assembleia Geral das Nações Unidas debateu sobre o envelhecimento da população Mundial e criou o dia Internacional do Idoso comemorado no dia 01 de outubro. Muitas pessoas podem se questionar: por que ter um dia para as pessoas mais velhas? Por que tantas pessoas vem falando sobre o envelhecimento humano? Por outro lado, outros podem perguntar: Para que falar de velhice? O novo é muito mais atrativo do que o velho?

Essas indagações são extremamente relevantes e precisam ser respondidas de forma clara para que toda sociedade tome conhecimento das mudanças pelas quais passarão no futuro próximo. Inicialmente, é importante destacarmos que o aumento na expectativa de vida deve ser muito comemorado, uma vez que representa o avanço das condições de saúde que permitiram acrescentar anos à vida. Estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020) para 2060, mostram que o Brasil terá 25% de sua população com mais de 65 anos. E por que é importante pensar em números que poderão aparecer somente daqui a 38 anos? Porque os dados da Organização Pan Americana de Saúde mostram que pelos menos 39,5% das pessoas que chegam a velhice no nosso país possuem alguma doença crônica e quase 30% possuem duas ou mais. Ou seja, a população brasileira ganhou anos de vida, mas não vive esses anos a mais com saúde, o que impacta diretamente nas condições socioeconômicas e nos serviços de saúde.

As doenças que mais afetam as pessoas idosas são as chamadas doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), como diabetes, câncer e doenças cardiovasculares. As DCNTs são responsáveis por mais de 70% de todas as mortes no mundo, o que equivale a 41 milhões de óbitos. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, em 2019, aproximadamente 13 milhões de brasileiros conviviam com diabetes (aproximadamente 8% da população). No entanto, as DCNTs que mais mata no Brasil são as doenças cardiovasculares (30%), como infarto e acidentes vasculares encefálico. Portanto, é importante refletirmos que temos uma grande parte da população brasileira envelhecendo de forma não saudável, acometidas por doenças cujo desenvolvimento de hábitos de vida mais saudáveis, como alimentação de qualidade e prática de atividades físicas poderiam prevenir. Além disso não se pode esquecer que a quantidade de pessoas com esse perfil aumentará consideravelmente nos próximos anos e precisamos buscar que toda sociedade envelheça de forma saudável.

Portanto, falar de envelhecimento é importante, e falar de envelhecer de forma saudável é imprescindível para o futuro do nosso país. Você sabia que existe grande possibilidade de que uma criança que nasça nesse momento viva mais de 100 anos? E você sabia que pode depender do local onde ela nasça? Pois a desigualdade social pode determinar a expectativa de vida de uma pessoa. Dados da cidade de São Paulo mostram que pessoas que nasceram em bairros mais ricos da cidade, vivem 24 anos a mais do que indivíduos que nasceram em bairros mais pobres. E esses dados estão relacionados ao acesso aos serviços de saúde e a educação de qualidade.

A sociedade brasileira precisa refletir sobre o envelhecimento e compreender que a importância é tão grande que a Organização Mundial da Saúde decretou os anos de 2021 a 2030 como a década do Envelhecimento Saudável. Oportunidade para reunir governos, sociedade civil, agências internacionais, profissionais, instituições acadêmicas, mídia e setor privado implementarem ações efetivas para melhorar a vida das pessoas idosas, suas famílias e as comunidades onde vivem. Quatro ações principais foram determinadas:

  • Mudar a forma como pensamos, sentimos e agimos com relação à idade eo envelhecimento: garantir a seguridade social, acessibilidade, inclusão digital, dar igualdade de direitos às pessoas idosas, combater o idadismo (preconceito associado a idade).
  • Garantir que as comunidades promovam as capacidades das pessoas idosas: ambientes amigáveis às pessoas idosas são os melhores lugares onde se pode crescer, viver, trabalhar, brincar e envelhecer, ou seja, uma comunidade amigável à pessoa idosa é um lugar melhor para todas as pessoas e idades.
  • Entregar serviços de cuidados integrados e de atenção primária à saúde centrados na pessoa e adequados à pessoa idosa: o sistema de saúde deve estar preparado para prestar uma assistência de saúde de boa qualidade e com uma abordagem multiprofissional e centrada na pessoa idosa.
  • Propiciar o acesso a cuidados de longo prazo às pessoas idosas que necessitem: essencial para manter a capacidade funcional, desfrutar dos direitos humanos básicos e viver com dignidade.

Portanto, é preciso modificar a forma como falamos de envelhecimento, uma vez que todos vivemos esse processo, é o momento para discutirmos que tipo de velho queremos ser? “Obsoletos” ou “Vintage”? Em qual ambiente queremos envelhecer? Que contribuições nossa experiencia de vida pode dar aos mais jovens? Devo querer que o passado retorne? Ou me adaptar às modernidade da sociedade contemporânea? Afinal de contas, como canta Arnaldo Antunes, a coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer.

Profa. Dra. Marta F. Bastos
Possui graduação em Biomedicina e mestrado em Doenças Tropicais pela UNESP- Campus Botucatu, e doutorado em Ciências (Biologia Molecular) pela UNIFESP. Atua como professor adjunto da Universidade São Judas Tadeu nos cursos de graduação em Biomedicina e Medicina. Atualmente é vice coordenadora e docente permanente do Programa de Ciências do Envelhecimento (nível mestrado), desenvolvendo estudos sobre: os impactos das condições socioeconômicas sobre o envelhecimento, processo inflamatório associado ao envelhecimento e os impactos de intervenções estéticas na saúde, autoestima e qualidade de pessoas envelhescentes e idosas. Coordena o projeto de extensão “Aprenda a empreender” para o publico 50+.